Escrito por Kimberly Silva, Consultora Sênior de P&D
De acordo com uma pesquisa da Capterra, 58% dos candidatos a vagas de emprego utilizam inteligência artificial para auxiliá-los na hora de se inscrever para posições abertas. Essa tendência acompanha o relatório recente do LinkedIn, que mostrou que a plataforma processa mais de 11.000 candidaturas por minuto — um aumento de 45% desde 2024. Enquanto alguns defendem que isso representa eficiência brilhante, outros argumentam que o uso da IA por candidatos para criar aplicações e se candidatar instantaneamente a milhares de vagas é inautêntico e preguiçoso. Independentemente da posição, é uma nova e interessante forma de engajamento dos candidatos com o mercado de trabalho que merece nossa atenção.
O uso da IA no processo de candidatura
Hoje, candidatos podem usar IA para automatizar quase todas as etapas da inscrição — desde encontrar vagas até enviar currículos e até negociar salários. Alguns criam ferramentas próprias de autoaplicação com scrapers, algoritmos de correspondência de habilidades e editores; outros contratam provedores para fazer isso por eles. Esses sistemas varrem centenas de portais de emprego, combinam funções com o perfil do candidato, preenchem aplicações e as enviam em segundos — transformando uma tarefa antes demorada e trabalhosa em um passo quase sem esforço em direção ao emprego.
Com provedores pagos, como AIApply ou Apply Sloth, o processo é simples: cria-se um perfil com credenciais e preferências de trabalho e o provedor faz o resto. Usando IA, esses serviços identificam vagas relevantes, preenchem campos genéricos e geram currículos e cartas de apresentação adaptados a cada posição e empregador. Isso ajuda a superar filtros automáticos e alcançar recrutadores humanos. Os planos geralmente são por assinatura, com preços e serviços variados, que podem incluir também preparação para entrevistas (como simulações e coaching para perguntas comportamentais), tradução, dashboards de acompanhamento de candidaturas e até orientações de negociação salarial baseadas em IA.
Por que candidatos usam IA no processo de candidatura
Entender como os candidatos usam IA é importante, mas também é fundamental explorar por que fazem isso.
Um dos principais fatores é a fadiga de busca. Preencher uma aplicação leva, em média, 23 minutos e 51 cliques. Segundo o Indeed, candidatos devem “mirar em 10 a 15 aplicações por semana”. Com tempo médio de desemprego nos EUA de cinco meses e meio, uma pessoa pode gastar pelo menos 84 horas preenchendo candidaturas antes de conseguir um emprego. A IA reduz drasticamente esse tempo ao simplificar tarefas repetitivas e desgastantes.
Outro fator é a baixa taxa de resposta. Em 2020, Andrew Seaman fez uma enquete no LinkedIn e descobriu que 93% das pessoas já foram ignoradas por empresas em algum momento do processo seletivo, mesmo após contato inicial. Pesquisas mostram que a taxa de resposta em plataformas como LinkedIn e Indeed varia de 3% a 25%, o que significa que a maioria nunca terá retorno. Esse cenário leva muitos a deixarem que a IA faça o trabalho pesado e reservarem energia para fases posteriores.
Há ainda a reciprocidade: se empresas já automatizam processos de triagem, entrevistas e comunicações, muitos candidatos sentem que também podem usar IA para equilibrar o jogo. Além disso, a ferramenta auxilia na checagem de vagas legítimas, na otimização dos materiais de aplicação e na competição com outros candidatos que também já usam IA.
O problema do uso da IA em recrutamento e seleção
Apesar das vantagens, o uso da inteligência artificial cria desafios para os empregadores.
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Volume de candidaturas: centenas ou milhares de inscrições para uma única vaga, muitas sem qualificação adequada. Isso sobrecarrega recrutadores e pode levar à perda de bons candidatos.
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Autenticidade: currículos e cartas começam a soar iguais, dificultando distinguir quem realmente tem as competências ou apenas utilizou palavras-chave geradas pela IA.
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Equidade: se apenas quem pode pagar por ferramentas avançadas tem acesso a elas, isso pode ampliar desigualdades sociais. Além disso, algumas empresas veem o uso de IA como falta de integridade. Segundo pesquisa da CV Genius, 74% dos recrutadores dizem identificar cartas feitas por IA e 57% rejeitariam candidatos que utilizaram esse recurso.
Os benefícios do uso da IA em recrutamento e seleção
Nem todas as empresas enxergam a IA como ameaça. Algumas até incentivam seu uso, especialmente em tarefas repetitivas.
Para empresas menos conhecidas, que contratam para cargos de nicho ou precisam preencher muitas vagas, a IA pode aumentar a visibilidade das posições e atrair candidatos que não encontrariam o anúncio de outra forma. Além disso, pode reforçar o employer branding, ajudando a atrair profissionais que realmente se identifiquem com a cultura e valores.
Recomendações para lidar com a IA
Para candidatos
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Trate a IA como ponto de partida: use-a para estruturar ideias, mas sempre personalize o texto.
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Verifique a precisão: não confie cegamente nas informações geradas.
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Seja seletivo: escolha as vagas de acordo com seus objetivos e pesquisas pessoais.
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Respeite os limites das empresas: se a vaga proíbe IA, siga a regra e seja honesto sobre seu uso.
Para empresas
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Tenha empatia: considere que alguns candidatos usam IA para superar barreiras.
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Foquem em habilidades, não apenas em credenciais: invistam em testes práticos e avaliações de competências.
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Personalizem a experiência: não deixem de lado o contato humano.
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Fortaleçam o employer branding: deixem missão, cultura e expectativas claras nas descrições de vagas.
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Sejam transparentes: comuniquem políticas sobre o uso de IA no processo seletivo.
O equilíbrio é fundamental
Não se trata mais de se candidatos e empresas usarão IA em recrutamento, mas de quanto ela será utilizada. O desafio está em equilibrar eficiência e humanidade. Há um vasto potencial na aplicação da inteligência artificial no trabalho, e estamos apenas começando a explorá-lo.
Sobre a autora
Kimberly Silva, PhD, é Consultora Sênior de P&D na Talogy, especialista em design, otimização e inovação de avaliações. É referência em psicometria e em uso de Inteligência Artificial em gestão de talentos. Atualmente, dedica-se ao desenvolvimento de soluções científicas e éticas para seleção, desenvolvimento e bem-estar de pessoas.